Janela Publicitária    
 
  Publicada desde 15/07/1977.
Na Web desde 12/07/1996.
 

Janela Publicitária - Edição de 08/JUN/1990
Marcio Ehrlich

 

Esta edição da Janela Publicitária foi publicada originalmente no jornal Monitor Mercantil.
O seu conteúdo foi escaneado e transcrito para ficar à disposição de consultas pela internet.

Publicitários analisam a crise do mercado carioca

Semana passada, prometi que traria a opinião de alguns dos principais executivos das agências cariocas sobre as perdas de contas daqui para agências paulistas, que volta e meia acontecem. E tiverem sua gota d'água – ou talvez seu balde d'água – na saída da conta da Brahma dos escritórios cariocas da Artplan, Standard e Thompson para a agência paulista Fischer & Justus.
Para simplificar a conversa, fiz as mesmas perguntas a todos com quem consegui falar: Valdir Siqueira (VS Escala), Vicente de Vicq (Almap/BBDO), Elysio Pires (Caio), Juan Vicente (DPZ) e John Hoyle (Standard).
Obviamente, a matéria - e as opiniões negativas – não são para baixar ainda mais o moral dos publicitários cariocas. Pelo contrário. Como captou bem John Hoyle, a perda enorme da conta da Brahma tem que ser vista como uma grande oportunidade que foi dada ao Rio de repensar a sua publicidade e adaptá-la aos novos tempos.
Vamos às opiniões destes altos executivos da propaganda carioca:

1 – O que leva um cliente carioca entregar a sua conta para uma agência de São Paulo?

Valdir – Isto acontece principalmente em empresas que trabalham com produto, e não há duvidas que, pelas características do mercado paulista, os profissionais de lá estão mais acostumados – e mais preparados – a trabalhar contas de produtos.
Vicente – O tamanho do mercado de São Paulo está se tornando uma força atrativa para todas as áreas de propaganda. Acho até que os veículos começaram a puxar esta fila, quando passaram a levar seus centros de decisão – na área comercial – para São Paulo. Isto também vem ajudando a esvaziar o Rio como área de decisão.
Elysio – Acho preconceituoso considerar que deve haver uma reserva de mercado em publicidade. Um cliente escolhe uma agência de São Paulo pelas mesmas razões que escolhe uma agência do Rio, inclusive por conhecer as pessoas da agência, já que em publicidade, confiança é um fator fundamental.
Juan – É um problema único e exclusivamente de competência. Leva quem demonstrar que tem mais competência.
Hoyle – Certos anunciantes tem uma imagem de que o produto criativo em São Paulo seja melhor, o que não acho. Mas a diferença de tamanho dos dois mercados não deveria permitir que houvesse uma comparação entre eles.

2 – Em que área de propaganda – principalmente de agência – a oferta de profissionais de primeiro time é inferior no Rio?

Valdir – Todas, pela própria questão da diferença de tamanho dos mercados.
Vicente – Em geral, em São Paulo, a oferta tem que ser maior em todas as áreas, mas o Rio tem menos profissionais experientes em planejamento.
Elysio – O Rio não tem deficiências em nenhuma área. Apenas a oferta é que é menor.
Juan – Em agência, acho que não há problema nenhum. A deficiência número 1 é em produção de cinema publicitário. Também temos menos fotógrafos e ilustradores.
Hoyle –Talvez nas áreas de Mídia e Pesquisa. O nível do Atendimento do Rio é igual ao de São Paulo e o da Criação também. Só que a Criação carioca é subestimada no próprio Rio de Janeiro.

3 – O Rio trabalha com muitas contas de governo, nas quais, de maneira geral, os padrões de exigência não se relacionam muito com os critérios profissionais. Isto poderia estar diminuindo os níveis de auto-exigência dos profissionais e empresários cariocas, prejudicando o resultado dos trabalhos feitos para a iniciativa privada?

Valdir – Sem dúvida é difícil administrar, com o pessoal da agência, esta diferença que realmente existe entre as exigências dos clientes de governo e da iniciativa privada. Mas não acho que isto chegue a prejudicar. Tudo vai depender da percentagem das contas de governo – ou de qualquer outro cliente pouco exigente – no volume de trabalho da agência. É claro que trabalhando para um volume maior de bons clientes, a agência melhora o seu nível como um todo.
Vicente – Pela minha experiência, não. Pelo menos entre o pessoal de criação, que também está sempre trabalhando pelo seu próprio portfólio.
Elysio – Faz parte das características do Rio trabalhar com estes clientes de governo, assim como com varejo e imóveis, que também não exigem criatividade como os clientes de produto. Mas não acho que influencie.
Juan – O que vem primeiro, o ovo ou a galinha? O mercado carioca tem que atender estas contas de governo, como buscar clientes de varejo e imóveis. Há muito menos chances de encontrar empresas de produto. Mas não acredito que isto desestimule o profissional.
Hoyle – Como a Standard não atende conta de governo, não posso dizer. Quando trabalhávamos com a comunicação de Embratur no exterior, as exigências eram tão profissionais quanto as de qualquer outro cliente, pela competição que há lá fora.

4 – O Rio oferece menos espaços de aperfeiçoamento profissional, quantitativa e qualificativamente? E as agências cariocas estimulam o treinamento de seus profissionais?

Valdir – Mais uma vez o tamanho de São Paulo faz com que lá haja mais espaços. Muitas palestras e cursos de profissionais estrangeiros só acontecem lá. Além disso, o mercado carioca não cobra o aperfeiçoamento dos profissionais. Talvez porque os próprios clientes aqui são menos competitivos.
Vicente – Pelo que aparece de currículos e profissionais se oferecendo aqui na agência, eu noto que o nível de formação e aperfeiçoamento está muito baixo. O resultado é que a gente fica sem ter onde buscar novos publicitários. A situação piora porque são pouquíssimas as agências que possuem algum sistema interno de treinamento para seus profissionais.
Elysio – Sem dúvida o Rio tem menos que São Paulo. Mas não acho que as agências cariocas possam ser responsabilizadas. Em Cannes, por exemplo, aonde vou há uns 10 anos, o percentual de presença de publicitários cariocas em relação aos paulistas não obedece à mesma relação que existe entre os mercados. E são as agências que pagam a ida de seus profissionais. O que falta mais no Rio é o espírito gregário dos próprios publicitários, que acaba não estimulando o aperfeiçoamento e a renovação.
Juan- Os maiores acontecimentos vão para São Paulo. As Semanas de Criação são em São Paulo. Mas também noto que as entidades paulistas se organizam melhor, criando mais eventos que estimulam a classe. E tenho certeza que, se as associações cariocas se organizassem neste sentido, as agências dariam apoio.
Hoyle – Realmente há muito poucas pessoas sendo preparadas, dentro ou fora das agências, para subir na profissão. Eu noto mesmo que, atualmente, não há mais tanta euforia e atração entre os estudantes – ou pessoas de outras áreas – para entrar em propaganda. Ainda por cima são poucas as agências no Rio que dispõem de um programa bem estruturado de estágio para treinar os novos e descobrir os talentos.

5 – Os salários – mais baixos que os de São Paulo – e as possibilidades de carreira no Rio teriam algumas influência do profissional?

Valdir – Não acho que seja por aí. O Rio paga menos não é só em publicidade, mas em todas as áreas.
Vicente – Isto é besteira de quem reclama.
Elysio – Não acho. Os salários da publicidade carioca não estão ruins.
Juan – Os salários não são tão menores assim. As agências que tem escritórios em São Paulo e no Rio (pelo menos a DPZ) procuram manter o mesmo nível. O que acho que desestimula o profissional carioca é a menor oportunidade de ele ser chamado por outras agências.
Hoyle – Hoje em dia todo mundo está ganhando pouco. Mas os salários do Rio estão compatíveis com a realidade deste mercado. Não há como fazer comparação com São Paulo.

6 – Qual é a saída para a propaganda carioca?

Valdir – É difícil o Rio de igualar a São Paulo, que tem uma cultura industrial que influencia o comportamento dos profissionais de todas as áreas, seja pela cobrança maior de produtividade como até pelo costume de a cidade começar a trabalhar mais cedo. Mas para o mercado publicitário carioca crescer será preciso o Rio também crescer. Particularmente, o que eu posso fazer na minha agência é buscar torná-la o mais profissional e equipada possível.
Vicente – A minha meta é fazer um escritório da agência no Rio tão competitivo quanto é o de São Paulo, para trazer os clientes cariocas de volta e pegar outras contas daqui mesmo. O Rio está cheio de clientes mal-atendidos, principalmente porque sinto que, na média, as agências cariocas não estão se profissionalizando com o ritmo que seria necessário para acompanhar o crescimento dos anunciantes.
Elysio – A crise do Rio não é propaganda, e sim da economia. O Rio realmente vai muito mal e mantendo-se situações como esta de implantação do Polo Petroquímico atrasar no seu cronograma, vai ser difícil o mercado melhorar tão cedo. Mas acho que poderia haver um estímulo interno no mercado para sacudi-lo. Por exemplo, acho desestimulante só ver eleições para as associações de propaganda com chapas únicas. A chapa única não é sinal de união dos associados. Pelo contrário. É sinal de absoluto desinteresse deles. Nem eu aguento mais ser eleito por chapa única.
Juan – A propaganda carioca está sendo prejudicada pelo esvaziamento do Estado. E não é que estejamos perdendo só para São Paulo. Minas e Rio Grande do Sul também estão se industrializando com rapidez. O Rio precisa tomar consciência de que o estímulo de atração de novas indústrias é fundamental e as agências deveriam se aliar e cobrar do Governo do Estado saída para a industrialização rápida do Rio. Uma campanha como a que Abap fez ano passado deveria ser continua e ainda receber maior apoio dos veículos cariocas.
Hoyle – O mercado mudou e na Standard já iniciamos o processo para descobrir qual o sistema mais eficiente para conseguimos um resultado criativo para os nossos clientes. Realmente fizemos uma grande enxugada na agência e estamos no meio desta avaliação do nosso futuro. É prematuro dar sugestões agora. Mas, por exemplo, estamos nos questionando se os métodos tradicionais de administração e atuação de uma agência de propaganda são realmente os mais adequados atualmente. Talvez eles não sejam mais, e a gente terá que descobrir quais são as novas formas de trabalhar em propaganda no Brasil, e em particular no Rio de Janeiro.