• “Black is Beautiful”, antigo em propaganda, novo em polêmica

    Black is Beautiful, pela Guinness
    O detergente Persil também já brincou com o slogan para seu produto Persil Black.
    O detergente Persil também já brincou com o slogan para seu produto Persil Black.

    “Tivessem a Santher e sua agência Neogama usado uma modelo negra, nada disso teria acontecido”. A análise é de um publicitário amigo da Janela, entre os muitos que esta semana tentaram entender as razões de mais uma nova onda de protestos contra uma peça publicitária na internet brasileira, desta vez contra a campanha do papel higiênico Personal Vip Black (veja no rodapé). A celeuma chegou ao The Guardian, na Inglaterra (veja aqui). E forçou a modelo escolhida para o lançamento, Marina Ruy Barbosa, a soltar um pedido de desculpas nas redes sociais:

    “Quando me convidaram e apresentaram a mensagem criativa da campanha para o produto Personal Vip Black, produto já existente no exterior e trazida pela Santher para o Brasil, fiquei animada em fazer uma campanha diferente e que seria uma novidade no nosso país.

    Lamento profundamente que algumas pessoas tenham interpretado o trabalho publicitário da Santher de forma diferente do que foi idealizado.

    Tenho certeza de que essa nunca tenha sido a intenção da marca e das pessoas que criaram esta ação, a de seguir por este caminho polêmico ou desrespeitar qualquer tipo de pessoa. Independente de tudo isso, eu lamento muito, de verdade, e peço desculpas às pessoas que se sentiram afetadas.

    Estou bem triste por tudo isso e espero que entendam que jamais foi feito com a intenção de ofender! Com amor, Marina.”

    Anúncio da marca Dansk Købenstyle, nos anos 70.
    Anúncio da marca Dansk Købenstyle, nos anos 70.

    A própria Santher não ficou atrás e postou na sua rede que estava deixando de usar o slogan:

    Gostaríamos de esclarecer que jamais tivemos qualquer intenção de provocar uma discussão de cunho racial através da campanha de lançamento do nosso Papel Personal Vip Black. Buscamos enfatizar a beleza e sofisticação da cor preta, ressaltando seu luxo e refinamento, em uma associação equivocada da frase adotada pelo movimento negro, que tanto respeitamos e admiramos Sempre é tempo de aprender. Tomamos a decisão de retirar o slogan da campanha e pedir desculpas para cada pessoa que, de alguma forma, se sentiu ofendida por nossa escolha. Queremos reforçar o compromisso que sempre tivemos com os brasileiros e com o Brasil, em 79 anos de mercado.

    A Janela, curiosa pela acusação de que o slogan “Black is Beautiful”, usado pelo movimento negro nos Estados Unidos, jamais poderia ter sido usado em publicidade, correu atrás para saber se o fato era inédito e descobriu que não. Os exemplos estão aqui na página, pela cerveja Guinness, pelos artigos de casa Dansk Købenstyle e pelo detergente Persil.

    Lendo mais nas redes sociais, identificamos também que a acusação de que o slogan não poderia ter sido usado em um papel higiênico, produto de uso tão prosaico. “O uso na Guinness é elogioso, além de a marca ter um dos maiores ‘love marks’ em alcoólicos”, citou, então, outro publicitário.

    Enfim, para o registro histórico, resolvemos deixar aqui registradas as imagens de todas as peças, abrindo a discussão aos leitores.

    A peça polêmica da Neogama para a Santher, lançando o Personal Vip Black com Marina Ruy Barbosa.
    A peça polêmica da Neogama para a Santher, lançando o Personal Vip Black com Marina Ruy Barbosa.

    Marcio Ehrlich

    Jornalista, publicitário e ator eventual. Escreve sobre publicidade desde 15 de julho de 1977, com passagens por jornais, revistas, rádios e tvs como Tribuna da Imprensa, O Globo, Última Hora, Jornal do Commercio, Monitor Mercantil, Rádio JB, Rádio Tupi FM, TV S e TV E.

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    Discussão

    1. gcconcei

      Marcio, com todo respeito ao seu trabalho, preciso tentar te “esclarecer”.

      O slogan é datado, tem propriedade e associação histórica com o movimento negro. Não é pelo fato da publicidade ter se apropriado desse slogan antes que não tenha sido no mínimo inadequado.

      Não é a cor do produto, não é a cor da modelo, é o uso da frase emblemática, do slogan já eternizado e irremediavelmente associado ao movimento negro dos 60 e 70. Criado para levantar a auto estima e permitir a população negra finalmente ter sua imagem, cabelo, cultura e cor associado à beleza.

      Agora, mesmo depois de anos de luta por conquista de direitos civis, pelo fim das associações imagéticas negativas do corpo negro na mídia, contra e racismo e, por incrível que ainda possa parecer, pela sobrevivência, a publicidade tem a cara de pau de se apropriar de um grito histórico de luta por existência e associar esse grito a um papel de limpar cu.

      Espero realmente que entenda que, “se a modelo fosse negra” não ia mudar a grande falta de bom senso desta agência. Que se o Fasano usasse “quem tem fome tem pressa” para um fast food elitista, seria igualmente escandaloso, ofensivo, inapropriado, sem bom senso e estúpido.

      Acredito que boa parte das ações racistas nascem da ignorância, mas defender a ignorância para negar o racismo é dar veracidade a ele.

      1. Guy Giorge

        A novidade de um branco publicitário tentando explicar como a sociedade deve se sentir com empresas se apropriando de marcos culturais é exatamente nula.

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