22 de junho de 2008, domingo
A
ÚLTIMA NOITE E O BALANCÊ-BALANCÊ DO FESTIVAL
FILM LIONS: O FIM DA CLASSE MÉDIA
Terminada a exibição da premiação,
ainda há pouco aqui em Cannes, o recado dos leões
é claro: acabou a classe média da propaganda.
Explico. É só dar uma olhada em quem ganhou.
Aqui, ou você gasta na elaboração da sua idéia,
tem uma produção bacanuda, um grande diretor, uma
excelente fotografia, um ilustrador realmente diferente a serviço
da sua criação ou você é aquele cara
que se vira sem dinheiro, mas é genial.
Ou você é Spielberg ou é Woody Allen. Ou é
o Cristiano Ronaldo ou é o Garrincha.
Ou você é a caríssima campanha da McCann para
Halo3 ou como o Gorila da Fallon para Cadburys, ou você é
simples como o Lance Final da Leo Burnett ou a casa do Zezinho da
Almap, a Guerra da F/Nazca.
A boa idéia com produção que não é
100%, esquece. E muita coisa interessante acabou ficando pelo caminho,
por falta de capricho. Ou de despojamento.
GP KINDER OVO
A noite final do Festival começou com um discurso empolgados
dos organizadores do evento, exultando a perda da virgindade leonina
do Catar e da Letônia, elogiou a Coréia e a China e
chamegou com as palavras o “gigante criativo indiano”
que tinha mostrado que estava acordado e faminto.
Mas terminou com um Kinder Ovo: a surpresa da política decisão
de dividir o GP de Film em dois, para os Estados Unidos e a Inglaterra,
para o Gorila da Cadburys e para o videogame da Microsoft. Halo
3 já tinha levado em o GP Integrated e a ação
da japonesa Projector para a rede de lojas de roupas Uniqlo em Titanium
(antes, tinha levado também um GP em Cyber).
Sobre a ação nipônica, ouvi muita gente dividida
sobre o se merecia. Estou no grupo dos que acham que não.
Um case fantástico de promoção do empreendedorismo
na Índia, "Lead
India", promovido pelo jornal The Times of India, foi aplaudidíssimo
e era o preferido de muita gente.
Mas o ano da responsabilidade social e ambiental foi o ano passado,
então os indianos foram para casa com leão, mas sem
este GP. E a genial ação espanhola para a Fundação
Prodis para pessoas com síndrome de Down (em que eles
criaram, produziram e atuaram na campanha) voltou para casa sem
um leãozinho sequer.
2008 foi o ano do big business, do videogame, do chocolate, dos
hambúrgueres da Burger Kind, do fashion oriental, da Procter&Gamble
como anunciante do ano. Alguém se tocou o que isso quer dizer
para a nova ordem da propaganda mundial, uma marca que sempre foi
considerada careta, levar este prêmio para casa?
O resultado do Brasil não foi o que muita gente esperava,
mas o segundo lugar da Almap como agência do ano talvez abafe
um pouco isso. Na verdade, tomara que não. O país
rendeu abaixo do seu potencial. Mas bem, ano que vem tem mais.
GRANDES DIRETORES, GRANDES NEGÓCIOS
Três diretores superstars do cinema ganharam leões
aqui em Cannes esta noita com comerciais de publicidade. Guy “Maddona”
Ritchie, com o filme
da 72andSunny para Nike, Sam Mendes (de Beleza Americana), ganhou
com a brilhante campanha da BBDO NY para HBO (não a Vouyer,
a Stories – e reparem como Mendes resolve o filme da cafeteria
e do assassinato com apenas 3 planos, para quê mais?), e o
grande Martin Scorceses, dirigindo para JWT o curta da Freixenet,
Key
to Reserva.
Só um detalhe curioso sobre esta campanha: ela foi baseada
num roteiro inacabado de Alfred Hitchcock que tinha apenas 3 páginas
e meia, certo. Pois muito bem. TIRARAM O HITCHCOCK DA FICHA, meus
amigos. O script é do cara e ele nem entrou na lista de quem
criou o filme. Pensando bem, o velho Hitch nem faria questão.
Nem precisa.
Scorcese apareceu também em outro filme muito bacana da AT&T
em que interrompe um telefone de um pai que está viajando
para um filho. Scorcese entra, começa a querer dirigir o
moleque, a mãe do moleque para no final o filme assinar dizendo:
“A gente não interrompe suas ligações.
Não interrompa nossos filmes com elas.”
Ah, nenhum dos três diretores citados nesta nota colocou os
pés no Palais para receber prêmio nenhum. Muito menos,
claro, o Hitchcock que por motivo de óbito próprio,
não poderia mesmo vir até a França.
O
ANO EM QUE CANNES VIROU UM CONGRESSO
Mudou e é definitivo. O festival de Cannes seguiu definitivamente
o seu rumo em direção a se tornar o maior congresso
de comunicação publicitária do mundo.
Crescem as palestras, os workshops e perdem o encanto as short lists,
que são apenas o resultado de quase tudo que a gente já
conhecia de ver pela internet. Até a de Titanium. Hoje dos
33 cases apresentados, eu já tinha visto 15.
A long list de filmes morreu, a categoria está inchada com
a entrada das sub-categorias internet e “other screens”
. Eu acho é que ano que vem vão oficializar 2 GPs
para Film.
Titanium continua mantendo a sua mística. E o júri
colaborou distribuindo pouquíssimo leões para essa
categoria, tornando-a ainda mais cobiçada.
E as festas? Pois é, nem falei, mas fui barrado da gala de
encerramento para fazer juz ao lado B desta cobertura. No geral,
acho que já foram melhores. Tirando a do Terra que comentei
aqui e a da Leo Burnett (ilustração ao lado), ontem,
que estava bem bacana, nada demais. Pouquíssima gente pagando
mico, pouca baixaria. Será que é um reflexo do tal
Big Business?
VOU PERDER O AVIÃO
Galera, vou nessa, tenho que desligar aqui. Queria agradecer a
todos vocês que me fizeram companhia aqui, aos que escreveram
(muita gente não tive como responder), aos que fingiram que
leram também.
Ao grande Sergio Gordilho e a indefectível Iara Barbizan
lá na Africa, que me ajudaram conseguir o tempo para estar
aqui.
E, em especial, ao galã das tigresas, o editor-chefe do bole-bole,
o homem que consegue fazer caça submarina com um Sonrisal
na mão e voltar com ele seco, o dono do boteco, Sir Marcio
Ehrlich que mais uma vez bateu com a cabeça em alguma prateleira
e achou que poderia ser divertido mandar um publicitário
comentar o festival de Cannes para vocês.
Obrigado a todos e até o próximo ano, se Deus quiser.
Fabio
Seidl, diretamente do Hotel Le Favelê, depois de brigar com
uma gerente maluca que cismou que eu não tinha pago a conta,
depois de subir e descer 5 andares de escada algumas vezes porque
o elevador deste pardieiro quebrou e ter passado a noite inteira
tentando enviar a coluna através do sistema wireless COM
fio inventado pelo dono das organizações Favelê.
E que claro, não funcionou. Tirei foto para vocês não
acharem que era mentira minha. Abração para todo mundo.
O redator Fabio
Seidl é o enviado (com todo o respeito) especial da Janela
em Cannes 2008.
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