Bola na Janela
Tinha começado a escrever esta coluna ainda durante a primeira
fase da Copa. Mas teve Cannes no meio, mil coisas atropelando. Bem,
tive que reescrevê-la, agora talvez de uma maneira mais pé
no chão.
TODO MUNDO QUERIA SER BRASILEIRO. COM MUITO ORGULHO,
COM MUITO AMOR.
A
primeira impressão que eu tive quando cheguei em Berlim foi
também a última, quando saí de Frankfurt: durante
a Copa, todo mundo quer ser brasileiro. Talvez, lá no fundo,
até os argentinos, que provavelmente só nos odeiam
por uma inconfessável inveja.
E sem dúvida, o maior embaixador da nossa cultura, o maior
garoto-propaganda da marca “Brasil”, é o próprio
brasileiro.
Na Alemanha, até onde não havia jogo do Brasil tinha
sempre uma rodinha de samba com gringos com camisa do Brasil. Alguns
bebendo caipirinha, em plena terra da cerveja.
A estação de metrô Potsdamer Platz, em Berlim
(foto à direita), virou a Pelé Station durante a Copa.
Não era Maradona Station, nem Beckenbauer Station. Pena que
viajaram no preço da exposição do Rei por lá:
15 Euricos. Alguns dias vazios depois, a organização
se tocou e passou para 5 minguelos a entrada.
Os shows da Copa da Cultura, que o ministro Gilberto Gil fez com
a Petrobras estavam sempre lotados fosse com o próprio Gil,
com a Daniela Mercury, o Marcelo D2 e se o Tiririca fizesse um acústico
por lá, os gringos também iriam ver, só porque
era do Brasil.
A
molecada também queria ser brasileira. Vi um guri fazer birra
com os pais porque queria pintar no rosto uma bandeira do Brasil
e não da Austrália, o país deles. No aeroporto,
um menino alemão que jogava bola com alguns torcedores e
disse que o sonho dele era jogar pela seleção brasileira.
Até a loja da Peugeot na Unter Den Linden (foto à
esquerda), a avenida mais sofisticada da capital, virou a “Peugeot
do Brasil”. Toda decorada de verde e amarelo, vendia Brahma,
pão de queijo... Hoje, isso vindo de uma marca francesa,
parece uma estranha ironia.
Chegou
ao ponto de, em Colônia, a classificação da
Suécia ser embalada por uma bloco de samba...alemão!
O grupo chamava-se Suco Legal (o fundador “chupou” o
nome de uma loja que ele foi em Salvador) e era capitaneado por
duas alemãzinhas, uma ruiva e uma loura, que tocavam e cantavam
clássicos do samba em português com sotaque. E as duas
deram um banho nos gaiatos brasileiros que pediram os instrumentos
para “ensinar” o samba.
Nas Fan Fest (leia mais abaixo sobre as Fan Fest), os gringos iam
atrás de onde estavam os brasileiros. Fosse pelo som do pandeiro,
fosse nas festas que eram montadas após os jogos sob os telões.
Numa delas aliás, um grupo de suecos protagonizou uma cena
campeã. Um brasileiro ensinou a eles uma cançãozinha
em português que dizia: “Uh, uh, uh, eu quero é
dar o...”
Postei
um videozinho com essa fanfarronice para vocês curtirem aí:
http://www.youtube.com/watch?v=h2GUGcmA08I
No Museu do Esporte, também em Colônia (foto à
esquerda), estavam expostas duas camisas de futebol que foram leiloadas.
A primeira, alemã, original da final de 74, vencida pela
Alemanha e assinada por todos os campeões. Outra, usada por
Pelé num jogo qualquer em 1971 e assinada só por ele.
E a do Rei custava quase o dobro.
Em Munique, o mesmo fanatismo por tudo que fosse brasileiro: o
show da Ivete estava esgotado há dias e só não
era mais disputado do que o jogo da seleção. A Marienplatz,
principal praça da cidade, por pouco não mudou de
nome para Brazilianplatz porque a torcida pelo Brasil tomou conta
daquilo.
Até
o espírito de sacanear os outros fazia o brasileiro se sentir
em casa. Fui a um restaurante que serviu um leitão batizado
de “Ronaldo”. Não foram poucas as provocações
com o nosso craque da camisa número 9. Os australianos por
exemplo, cantavam: “Ronaldo Ate All The Pies” ou “Ronaldo,
comeu todas as tortas”, o que lá na Austrália,
deve ter alguma graça.
Mas esse oba-oba internacional também refletiu negativamente
nos estádios. Quem estava nas arquibancadas verde e amarelo
era, na maioria, gringo. Por isso, ninguém cantava, nem gritava,
nem torcia.
Este fenômeno, curiosamente, só não aconteceu
no jogo contra a França, que teve a maioria brazuca, que
infelizmente, quando o time começou a ratear, a torcida resolveu
torcer contra ao invés de incentivar.
E depois deste jogo, veio a constatação. Não
tinha francês fazendo festa, nem mulheres dançando
can-can, nada. Um ou outro maluco tocando corneta. Só. A
Copa do Mundo é muito mais triste sem o Brasil. Pena que
os nossos jogadores não tiveram tanta disposição
quanto a nossa torcida.
A COPA DA ADIDAS
Marca
mais lembrada nas pesquisas relacionadas a Copa feitas durante o
mundial, a Adidas tomou a boca da Nike.
Jogando em casa, a marca marcou sob pressão. Já no
aeroporto, várias ações. Duas delas bastante
curiosas. Uma mala enorme com onze alças, escrito Kaká
+10 e uma taça embrulhada, como se fosse uma encomenda para
o Ballack, na esteira de bagagens. Kaká, mala...ok, ok.
Em
Berlim, todo mundo curtiu o Adidas World of Football, um mini-parque
temático de Futebol que a Adidas montou em Berlim e em frente
ao Reichstag, o parlamento alemão.
A atração principal do parque era a réplica
do estádio Olímpico de Berlim, com arquibancadas de
verdade com telões para que a galera visse o jogo e um campinho
artificial onde no intervalo aconteciam ações promocionais.
Em
torno do “estádio”, brinquedos e atrações
sobre o futebol: máquinas que testavam a sua habilidade nas
faltas e cabeçadas, testavam a potência do chute, jogos
eletrônicos e interativos, uma megastore da Adidas com produtos
exclusivos e uma área de alimentação com McDonald´s
e tudo.
A Adidas só não conseguiu travar a procura frenética
pelas camisas do Brasil. As lojas da Nike em dia do jogo pareciam
que estavam dando as camisas do Brasil de tanta gente lá
dentro.
Talvez por isso, nas lojas oficiais da Copa, as Fan Shops, a única
camisa de seleção que não era da Adidas era
a do Brasil.
FAN FEST
As Fan Fests são uma espécie de Alzirão de
luxo. Para quem não é carioca e não conhece
a Rua Alzira Brandão na Tijuca: é o lugar que rola
um telão, a maior festa e as barraquinhas de churrasquinho
de gato e o isopor com cerveja a um real. As Fan Fest eram isso,
mas feitas por alemães.
Tinham
o status de áreas oficiais dos torcedores na Copa. E cada
cidade tinha uma Fan Fest diferente, sempre próxima às
principais atrações turísticas e com o kit
básico: supertelão com arquibancada e “geral”.
Tendas com souvenir, entretenimento promovido por grandes marcas,
comidas típicas (ou não) e claro, muita cerveja alemã.
Parece redundância falar em cerveja alemã, mas nos
estádios a cerveja (com álcool, contradizendo as recomendações
da FIFA) era americana, Budweiser. Uma heresia.
Tive
a oportunidade de participar de um seminário da FIFA, em
Munique, a convite do meu amigo Marcelo Cordeiro (obrigado, cara!),
onde apresentaram como surgiram as Fan Fest.
O conceito foi criado depois de incidentes na Coréia em
2002. Como até então tudo relacionado ao povo na Copa
ficava à mercê da espontaneidade popular, telões
nas praças e oferta precária de bebida, comida e nada
de banheiros. Até que um dia mais de 10 mil pessoas se meteram
num quebra-quebra histórico.
Aí
a FIFA teve a idéia de apresentar o projeto para as cidades-sede,
algo que ainda proporciona a oportunidade de oferecer espaços
de mídia e exploração comercial às marcas
locais. E, claro, controla melhor a multidão que só
entra apos ser revistada.
Em Berlim, a maior de todas as Fan Fests acabou se transformando
num grande complexo. Eram 4 telões (cada um de um patrocinador),
que se transformavam em boites ao ar livre após os jogos
e estavam integrados à zona da Copa da Cultura do Brasil,
ao Adidas World of Football e a um museu interativo em forma de
bola, o Global Fussball (imagem à direita).
Em Colônia, a Fan Fest foi espalhada por várias praças
históricas da cidade.
Em
Munique, a Fan Fest foi feita no estádio com a arquitetura
mais bonita do país, que fica num vale cercado por um lago.
O lugar esteve cotado para receber a Copa, mas o arquiteto do projeto
simplesmente não aceitou que mexessem na sua idéia
original para ampliar a capacidade do seu Olympiastadion, construído
para os Jogos Olímpicos de 1972.
Ou seja, o cliente quis mudar, o criativo disse que não
então simbora lá procurar alguém para construir
o Allianz Arena (foto à esquerda), o “pneuzão”
que muda de cor e que, aliás, teve que mudar de nome durante
a Copa, porque com a FIFA os estádios não podem ter
nome de empresa.
Já
em Frankfurt (foto à direita), dois telões foram colocados
sobre o Rio Main e nas margens a galera se divertia se empanturrando,
jogando peladinhas e até brincando numa roda gigante patrocinada
pela Mastercard.
A ORGANIZAÇÃO NA ALEMANHA
Os alemães não são perfeitos como a gente
acha. Mas ok, foram quase. É que num evento do tamanho da
Copa, não tem como não dar zica. Nos bares em volta
do estádio ou das Fan Fest por exemplo, só cerveja
em garrafa. Então as ruas, após os jogos, viravam
um mar de caco de vidro.
Em
algumas áreas vitais para o bom funcionamento da Copa, como
no serviço de informações do metrô ou
em algumas grandes estações de trem, faltou gente
falando inglês.
O sistema de venda de ingressos foi outra coisa que muita gente
reclamou, pela pouca carga de bilhetes. Quem queria comprar acabou
ficando com a raspa da mandioca dos patrocinadores.
Um golpe que eu descobri que estavam aplicando no final da Copa
e que poderia ter sido facilmente evitado: o malaco pegava os ingressos
de quem já tinha entrado e, como NADA acontecia com os ingressos
além de passarem num scanner, os revendia como novos, por
pequenas fortunas. E era só a organização ter
furado os ingressos ou picotado o canhoto...
A polícia não podia ajudar muito quem levou cano
dos cambistas, mas agia rápido ao sinal de qualquer outra
confusão. E para mostrar sua imparcialidade cobriram nos
carros e uniformes as bandeiras da Alemanha. Afinal, durante a Copa,
a polícia era neutra.
Esse “protocolo” caiu em Frankfurt, após a vitória
da Alemanha nas quartas de final. Os “tiras” (porque
é que nos filmes os atores chamam os policiais de tiras se
ninguém fala assim na vida real?) resolveram comemorar também
e pintaram no rosto a bandeira alemã.
O SHOW DA MÍDIA
O
seminário da FIFA também apresentou como são
transmitidos os jogos. E é tanta tecnologia que boa parte
do mundo não vai conseguir assimilar tão cedo.
Por exemplo, até 2006 o mundo todo via praticamente as mesmas
imagens dos jogos. Alguns, como nós, até tínhamos
uma câmera exclusiva da Globo dando outros detalhes. Agora
são disponibilizadas as imagens das 25 câmeras de cada
estádio para que cada país possa fazer a sua edição.
O problema é que países mais pobres mal conseguem
editar com 4 câmeras.
Para
agilizar a transmissão, a Alemanha investiu em 8 carros emissores
de sinais de satélite que rodam pelo país. O problema
é que a África do Sul, país sede em 2010, já
avisou que não tem como comprar estes carros (US$ 8 milhões
cada).
Vai ser uma grana também construir um complexo do tamanho
do Munchen Media Center (foto acima), com espaço para receber
equipamentos e estúdios provisórios de mais de 260
rádios e TVs de todo o mundo, como foi este ano. Destas 260
aliás, 13 levando equipamentos de transmissão próprios
e gerando sinal exclusivo. A Globo entre elas.
Soube
lá também que a Copa já está sendo gravada
no novo sistema HD digital, que ainda nem temos capacidade de ver
nas nossas TVzinhas. Mas quando tivermos, vamos poder recordar tudo
com alta definição.
Infelizmente só não vai dar para melhorar a imagem
do futebolzinho que a gente jogou este ano.
Fica para a próxima, se tivermos mais cabeça. E raça.
OS PUBLICITÁRIOS NA COPA
Muitos publicitários brasileiros de várias partes
do pais (e de fora do país) estavam na Copa, acreditando
que o Brasil que aparece nos comerciais de TV ia fazer bonito também
nos campos da Alemanha. Independente do resultado, a galera voltou
pra casa com uma experiência única. Nada se compara
a uma Copa do Mundo.
Foto histórica: O paulista Fabio São Pedro (FCB
Portugal) e os cariocas Sergio Lobo (Leo Burnett Lisboa) e Aline
Arantes (também da FCB) estiveram com o humorista Bussunda. |
O rubronegro Diogo Mello (McCann Portugal) descolou um autografo
do ídolo Júnior antes do Brasil x Croácia.
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Dan Zecchinelli (RC-MG) e Carlos Renato (Arcos-PE) corriam noite
e dia atrás de ingressos. E com mais disposição
que os laterais da seleção. |
Carlos “Dedé” Eyer (África) e André
Gustavo (JWT-SP) emendaram a Copa com Cannes. |
Os “Bemfica Brothers”, Miguel (DM9 SP) e Paulo (Y&R
Portugal) com suas perucas que viraram atração
turística. |
O paulista William Silva (FCB Lisboa) também aderiu ao
visual black power. |
Luis Coimbra (Foot Entertainment) se juntou aos criativos paulistas
Tomás Corrêa e Bruno Ribeiro (Leo Burnett Lisboa)
e cariocas Pedro Prado (F/Nazca Rio) e Fabio Seidl (McCann Portugal)
|
André Kirkelis (Leo Burnett SP) no metrô, mandando
um alô pro Brasil. |
Fábio
Seidl é redator da McCann-Erickson Portugal-
Mes/2006)
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